quinta-feira, 20 de setembro de 2007

HISTÓRIAS DO TENENTE ADAUTO - 2

Histórias do Tenente Adauto - 2

O Tenente Adauto, depois de ser transferido pelo Exército de Natal para Fortaleza, estabeleceu-se na rua Dragão do Mar, na Praia de Iracema. À época exercia a patente de sargento e prestava serviço no Quartel General da 10ª Região Militar, na Fortaleza de Nossa Senhora de Assunção, o conhecido Forte. Naquela casa simples da Dragão do Mar, sem maiores confortos, ele e a matriarca Irene enveredaram suas crias no rumo dos estudos e da leitura.

Lembro-me quando criança, cinco ou seis anos, íamos com o Tenente, à praia todos os domingos, eu e o irmão Tuca, um ano mais novo. O local da praia de Iracema escolhido por ele era geralmente a "piscininha", em frente ao restaurante Estoril, por oferecer menos perigo e ser ponto de encontro com seus amigos de boemia. Apreciador incondicional de uma boa cachaça fazia duas paradas obrigatórias no percurso antes de chegar à praia, primeiro na bodega do Abelardo e depois no bar do Oliveira. No Abelardo solicitava três "calibrinas", como chamava a dose da aguardente de cana e incontinenti, o bodegueiro enchia três copos de um líquido amarelo. Secretamente combinava com o Abelardo que para nós, deveria ser sevida cajuína mas em seu copo caprichasse na cana. Saíamos satisfeitos em sorver o delicioso suco do caju, imaginando que nós três havíamos tomado a mesma bebida, a "calibrina". Na conta de cachaça que fazia na bodega do Abelardo, mandava que este escrevesse no caderno, em uma anotação à parte, a palavra "lapada". Em seguida solicitava que a cada dose tomada, fosse atribuído um tracinho vertical ao lado da palavra "lapada", facilitando assim a contagem no final do mês.

Na bodega do Abelardo eram também feitas as compras mensais da família e os suprimentos solicitados anotados em um caderninho para serem pagos ao final de cada mês, como era o costume da época. A matriarca Irene organizava os pagamentos, conferindo as compras atentamente despesa por despesa. Ocorre que certo mês, por engano, o bodegueiro juntou as duas contas, a que continha trinta e quatro "lapadas" e a referente aos mantimentos consumidos mensalmente. Irene atordoada e furiosa, resolveu saber o que significavam aquelas "lapadas", desconfiando que boa coisa seu marido não aprontara, assim o esperou ao final do dia para as devidas explicações.

Ao chegar do expediente do quartel, o Tenente Adauto se depara com aquela baixinha, que diante de sua fúria se tornava uma gigante, soltando fogo pelas narinas de tanta raiva!

Que foi Irene? Perguntou o Tenente. E Irene:

O que significam essas "lapadas" aqui nessa conta, que é que tu andasse fazendo, sem vergonha?

O Tenente olhou demoradamente para a conta de trinta e quatro "lapadas", empalideceu e avermelhou-se várias vezes e se saiu com essa tirada:

Ah, Aberlado burro! Eu mandei que ele anotasse as lâmpadas que eu comprei para a quermesse que vai haver no clube General Sampaio*, e ele em vez de lâmpada escreveu foi "lapada". Ah, animal!

Pareceu convincente a explicação, tanto que a matriarca Irene arrefeceu sua emoção, e assim o Tenente se livrou daquele inconveniente "mal entendido". Depois, junto ao bodegueiro trapalhão, mudou a nomenclatura de sua bebida, passando a chamá-la "suco de maçã".

Autor: Nivaldo Barros da Costa - o 7º filho do Tenente Adauto.

*Clube dos Sargentos do Exército que funcionava na Avenida da Universidade esquina com a Domingos Olímpio.

Visite o blog do Negão http://nbarroscosta.blogspot.com

Nenhum comentário: